A Verdade Sobre os Riscos do Sistema Elétrico Brasileiro
- Energy Channel United States

- 24 de set.
- 4 min de leitura
Por Daniel Lima – ECOnomista

No Brasil, alguns setores parecem apostar na teoria do caos. Talvez por envolver eletricidade, força e potência, o setor elétrico é um dos mais emblemáticos nesse aspecto. Uma característica marcante é o corporativismo de grandes empresas — em sua maioria multinacionais — que influenciam decisões estratégicas. E o mais preocupante: os órgãos gestores, reguladores e operadores do sistema elétrico brasileiro contam com diretores egressos dessas mesmas corporações.
A nova narrativa: culpar a geração distribuída
Nos últimos meses, segmentos do setor elétrico têm martelado na grande mídia um novo vilão: a geração distribuída (GD). Segundo “especialistas”, ela estaria atendendo a um percentual elevado da carga do Sistema Interligado Nacional (SIN), forçando o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) a desligar usinas centralizadas para manter o equilíbrio de frequência.
O assunto ganhou tanta urgência que ANEEL, ONS e ABRADEE realizaram uma reunião fechada — sem imprensa e sem representantes da GD — para discutir protocolos de contingenciamento. O plano será detalhado pelo ONS até o final de outubro.
A verdade por trás dos números
Segundo o Relatório Mercado Cativo – SAMP da ANEEL, o mercado cativo possui cerca de 93 milhões de unidades consumidoras, que consumiram aproximadamente 170 milhões de MWh até julho de 2025, movimentando R$ 148 bilhões com impostos.
A GD, por sua vez, conta com 43 GW de potência instalada, distribuída em 3,8 milhões de usinas solares espalhadas por mais de 5.500 municípios, gerando créditos para 7 milhões de unidades consumidoras — sendo 87% nas classes residencial (62%) e comercial (25%). Isso representa apenas 7,5% das UCs do país, e apenas 4% são consumidoras/geradoras.

A potência instalada média de GD por UC é de 6,3 kW. Se considerarmos apenas a classe residencial a potência média é de 5,0 kW.
Energia solar não é privilégio de ricos
Um sistema solar de 5,0 kW custa cerca de R$ 20 mil instalado. Financiado em 60 meses a 1,5% a.m., gera uma parcela de aproximadamente R$ 510. Com produção média de 600 kWh/mês, o sistema se paga com a economia gerada. Ou seja, cabe no orçamento da grande maioria das famílias brasileiras, exceto aquelas em situação de vulnerabilidade — que já são atendidas pela Tarifa Social de Energia Elétrica.

GD representa geração e consumo local e equilíbrio regional
Outro dado essencial: 72% da potência instalada em GD está na própria unidade geradora e consumidora. Apenas 28% são remotas.

Há também equilíbrio geográfico entre geração e consumo na GD:
Sul e Sudeste/Centro-Oeste: 71%
Nordeste: 21%
Norte: 8%
Destaques por estado:
São Paulo: 14%
Minas Gerais: 13%
Paraná: 9%
Bahia: 5%
Ou seja, a GD está onde a demanda ou o consumo está. Não há sobra de GD para ser exportada pela rede básica.
O problema: A concentração da geração centralizada
Segundo o ONS, a geração centralizada apresenta os seguintes números:
Eólica – Total: 35,6 GW
Nordeste: 32,9 GW (92,8%)
Sul: 2,3 GW (6%)
Norte e Sudeste/Centro-Oeste: inexpressivo
Solar Centralizada – Total: 19,4 GW
Nordeste: 10,7 GW (55%)
Sudeste/Centro-Oeste: 8,7 GW (45%)
Sul e Norte: praticamente irrelevantes
A região Nordeste concentra 43,6 GW nos grandes parques eólicos e solares — cerca de 80% da capacidade instalada dessas fontes. A geração eólica com 32,9 GW, por exemplo, está 93% concentrada no Nordeste.

O verdadeiro gargalo: o descompasso entre geração, consumo e transmissão
O problema não é a GD. É o descompasso no Nordeste entre a concentração da geração centralizada e a capacidade de consumo local, agravado pela deficiência da infraestrutura de transmissão.
A sobrecarga e os cortes nas usinas do Nordeste decorrem de um modelo de expansão centralizada e mal planejada. Não se constroem parques sem outorgas da ANEEL e do ONS. A saturação é fruto da ausência de planejamento e de investimentos proporcionais em linhas de transmissão.
O risco não é a GD — é a narrativa
A geração distribuída não é ameaça, é solução. Ela democratiza o acesso à energia limpa, reduz a pressão sobre o sistema centralizado e empodera o consumidor.
O verdadeiro risco está em decisões tomadas sem transparência, sem planejamento e sem diálogo com todos os agentes.
O Brasil precisa de uma política energética que valorize:
Descentralização
Inovação
Justiça energética
E isso começa por reconhecer que a GD não é o problema — é parte essencial da solução.
Daniel Lima é graduado em Ciências Econômicas e com MBA em Arquitetura, Construção e Gestão de Construção Sustentáveis, ao longo de sua carreira ocupou diversos cargos no setor público, na iniciativa privada e no terceiro setor.
Acumulou grande experiência na área de elaboração de projetos sustentáveis e na captação de recursos nacionais e internacionais. Destaca-se em seu currículo a Coordenação Geral do Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR). Atualmente atua como especialista e consultor no segmento de energia solar, é CEO da Agrosolar Investimentos Sustentáveis e Conselheiro da startup Energia Verde do Brasil - EVBIO.
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