DA CHESF AO APAGÃO DE IDENTIDADE: A PRIVATIZAÇÃO DA ELETROBRAS E O SAQUE AO RIO SÃO FRANCISCO
- Energy Channel United States

- 24 de out.
- 3 min de leitura
Por Arthur Oliveira
O anúncio da Eletrobras, agora rebatizada como AXIA Energia, de extinguir o nome CHESF a partir de 10 de novembro de 2025 não tem nada de cosmético. Para mim, é o fim simbólico de uma era em que o Nordeste ainda tinha voz no comando do seu próprio destino hídrico e energético.

Quem nasceu ou vive sob a proteção do Rio São Francisco sente isso como uma perda profunda da nossa identidade e soberania. O que está sendo imposto desde a privatização de 2022 é um adeus forçado a um legado de quase 80 anos, trocado por uma marca global que pensa primeiro no lucro e só depois na vida das pessoas.
Esse nome AXIA, que vem do grego “valor”, unifica tudo sob uma identidade única e tenta apagar as raízes locais. Falam em agilidade e inovação. Para mim, é apenas rebranding para atrair investidores e esconder o passado estatal. O próprio presidente Lula já chamou essa privatização de escárnio e retrocesso. Concordo plenamente.
Agora, como Produtor Independente de Energia (PIE), a AXIA herda a descotização das grandes usinas do São Francisco. Estamos falando de Sobradinho, Itaparica, Paulo Afonso e Xingó, com uma Garantia Física de 5.400 MW médios. O risco é transformar o Velho Chico em um ativo financeiro. Irrigação e abastecimento ficam em segundo plano, como se água fosse apenas commodity. A Resolução ANA nº 2.081/2017 é um escudo frágil diante de um operador privado que só enxerga lucro.
O ENTERRO DA CHESF: PRIVATIZAÇÃO COMO APAGÃO REGIONAL
A CHESF, fundada em 1945 e incorporada à Eletrobras em 1974, não era só uma empresa. Era desenvolvimento de verdade para o Nordeste. Suas usinas, de Moxotó a Xingó, representam 10% da energia do país e garantem o funcionamento de Sobradinho, que regula secas em uma região onde vivem 18 milhões de pessoas.
Para nós, pernambucanos, baianos e nordestinos em geral, CHESF significa emprego, energia acessível e segurança hídrica. Agora vemos o nome sumindo das fachadas. O CNPJ segue, mas vazio de sentido.
A privatização de 2022, feita às pressas no fim do governo Bolsonaro, acelerou esse desmonte. Foi vendida por R$ 20 bilhões, apesar de ter patrimônio avaliado em R$ 68 bilhões. Eu vejo isso como entrega barata de um setor estratégico. Recentemente, 68% da Eletronuclear foi vendida por R$ 535 milhões aos irmãos Batista, conhecidos por escândalos. O padrão me parece claro: desmontar o que é nacional para favorecer grupos privados. Para o Nordeste, é o fim de uma base histórica que sempre nos sustentou.
DESCOTIZAÇÃO: A TENTAÇÃO LUCRATIVA QUE SECA O SEMIÁRIDO

A descotização é o verdadeiro veneno dessa história. Antes, com cotas, havia equilíbrio entre energia, irrigação para 1,5 milhão de hectares e abastecimento humano. Agora a AXIA pode negociar livremente 5.400 MW médios da cascata do São Francisco. Isso incentiva reduzir vazões e guardar água para vender energia mais cara.
Desde 2013, o São Francisco já sofre com secas e baixa disponibilidade hídrica de 1.886 m³/s, apenas 2,07% do volume nacional. Nos últimos anos, reduções de vazões de 1.300 para 800 m³/s em Xingó e Sobradinho afetaram agricultura, pesca e dezenas de comunidades ribeirinhas. Tudo em nome de ganhos financeiros.
Vejo isso como privatizar o rio junto com a energia. Tarifas mais caras, desemprego e interesses corporativos vencendo o direito básico à água. Muitos economistas e entidades já denunciaram isso, e eu concordo: a privatização concentra renda, ignora o clima e aumenta conflitos por água.
RESOLUÇÃO ANA 2.081/2017: UM ESCUDO DE PAPEL
Essa resolução foi criada para equilibrar os usos da água durante a crise de 2013 a 2017. Define vazões mínimas, faixas operacionais e autoriza intervenções do ONS. Só que é uma regra frágil, com várias brechas, sujeita a flexibilizações. Na prática, não impediu que o Baixo São Francisco fosse sacrificado. O PRHSF existe, mas sem fiscalização real, virou letra morta.
O que me deixa mais revoltado é ver que promessas de revitalização, como investimentos de R$ 350 milhões anuais, desaparecem aos poucos. O que sobra é risco social e ambiental para quem vive ali.
CONCLUSÃO
Não vejo a AXIA como evolução. Para mim, é o crepúsculo da CHESF e o prenúncio de um Nordeste ainda mais vulnerável. A descotização entrega 5.400 MW à ganância privada. A Resolução 2.081/2017 não dá conta de proteger o Velho Chico.
Cabe ao CBHSF, à ANA e à sociedade enfrentar esse modelo e defender usos múltiplos da água. O Rio São Francisco não é especulação. É vida. Sem vigilância e cobrança, a AXIA vai transformar a nossa água em pó. Como baiano de Juazeiro-BA, recuso-me a assistir isso em silêncio. Ainda há tempo de lutar.
DA CHESF AO APAGÃO DE IDENTIDADE: A PRIVATIZAÇÃO DA ELETROBRAS E O SAQUE AO RIO SÃO FRANCISCO






























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